RGPC na pratica

RGPC na Prática: Do Registo no MENAC ao Canal de Denúncias

Contexto Geral do RGPC

O Regime Geral de Prevenção da Corrupção (RGPC) em Portugal surge num contexto de harmonização internacional no combate à corrupção, impulsionado por convenções multilaterais, como a Convenção das Nações Unidas contra a Corrupção de 2003, ratificada por Portugal em 20071. O RGPC, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 109-E/2021 de 9 de dezembro, não se limita à repressão, mas foca-se fortemente na prevenção da corrupção.

Este diploma legal, em consonância com a Convenção das Nações Unidas contra a Corrupção, cria o Mecanismo Nacional Anticorrupção (MENAC), uma entidade administrativa independente com poderes de autoridade para promover a transparência e a integridade na ação pública, assegurando a efetividade das políticas de prevenção da corrupção e infrações conexas. O MENAC tem a missão de supervisionar e implementar o RGPC, emitindo orientações e diretivas, fiscalizando a implementação dos programas de cumprimento normativo e aplicando sanções em caso de incumprimento3….

Para além do contexto internacional, o RGPC também está alinhado com a Diretiva (UE) 2019/1937, relativa à proteção das pessoas que denunciam violações do direito da União, transposta para a ordem jurídica interna pela Lei n.º 93/2021, de 20 de dezembro. Esta diretiva e a respetiva lei nacional reforçam a importância dos canais de denúncia, tanto internos como externos, na prevenção e deteção da corrupção.

A convergência entre a legislação nacional e o quadro jurídico internacional demonstra o compromisso de Portugal na luta contra a corrupção. O RGPC, inspirado pelas melhores práticas internacionais e pela legislação da UE, visa promover uma cultura de ética e integridade, tanto no setor público como no privado.

o que é o MENAC

O MENAC, enquanto entidade administrativa independente, assume um papel central na promoção e acompanhamento do RGPC. As suas atribuições incluem a emissão de orientações e diretivas, a fiscalização da implementação dos programas de cumprimento normativo e a aplicação de sanções em caso de incumprimento.

A entrada em vigor do RGPC impõe às entidades abrangidas a adoção de medidas concretas para prevenir e detetar riscos de corrupção. A implementação de um Programa de Cumprimento Normativo (PCN) eficaz torna-se, assim, uma prioridade para as organizações, públicas e privadas.

A quem se aplica o RGPC

O Regime Geral de Prevenção da Corrupção (RGPC) aplica-se a uma vasta gama de entidades, tanto públicas como privadas, com o objetivo de promover a integridade e a transparência em Portugal. O Decreto-Lei n.º 109-E/2021 de 9 de dezembro define as entidades abrangidas por este regime.

Em resumo, o RGPC aplica-se a:

  • Pessoas coletivas com sede em Portugal que empreguem 50 ou mais trabalhadores: Isto significa que a maioria das empresas de média e grande dimensão em Portugal estão sujeitas ao RGP.
  • Sucursais em território nacional de pessoas coletivas com sede no estrangeiro que empreguem 50 ou mais trabalhadores: As empresas multinacionais com operações em Portugal também estão abrangidas pelo regime, desde que a sucursal empregue o número mínimo de trabalhadores.
  • Serviços e pessoas coletivas da administração direta e indireta do Estado, das regiões autónomas, das autarquias locais e do setor público empresarial: O RGPC aplica-se a todos os níveis da administração pública, desde o governo central até às autarquias locais.
  • Entidades administrativas independentes com funções de regulação da atividade económica dos setores privado, público e cooperativo: Estas entidades, como as autoridades reguladoras, também estão sujeitas ao RGPC.
  • Banco de Portugal: O banco central de Portugal está explicitamente incluído no âmbito da aplicação do RGPC.

É importante salientar que o RGPC não se limita apenas às entidades que empregam 50 ou mais trabalhadores. O MENAC pode, no âmbito das suas competências de fiscalização, solicitar a qualquer entidade privada que remeta a informação sobre o seu cumprimento normativo, independentemente do número de trabalhadores.

O objetivo do RGPC é criar uma cultura de ética e integridade, tanto no setor público como no privado, combatendo a corrupção de forma preventiva e eficaz. As entidades abrangidas devem implementar um Programa de Cumprimento Normativo (PCN) que contemple medidas adequadas à sua realidade e aos riscos específicos a que estão expostas.

Prazos para o cumprimento do RGPC

O Regime Geral de Prevenção da Corrupção (RGPC) entrou em vigor em duas fases distintas:

  • 7 de junho de 2022: A maior parte do RGPC, incluindo a obrigação de implementação do Programa de Cumprimento Normativo (PCN), entrou em vigor nesta data1.
  • 7 de junho de 2023: O capítulo IV do RGPC, que estabelece o regime sancionatório e a responsabilidade disciplinar para dirigentes e trabalhadores, produziu efeitos a partir desta data
  • 14 de fevereiro de 2025: Conforme esclarecido pelo MENAC, todas as entidades, tanto públicas como privadas, devem efetuar o registo na Plataforma RGPC e submeter a documentação comprovativa da implementação do seu Programa de Cumprimento Normativo (PCN).

Sanções de não cumprimento do registo no MENAC

O não cumprimento da obrigação de registo na Plataforma RGPC e submissão da documentação pode resultar em sanções, conforme previsto no regime sancionatório do RGPC.

As sanções para as entidades que não se registarem na Plataforma RGPC até 14 de fevereiro de 2025 estão previstas no Regime Geral de Prevenção da Corrupção (RGPC), nomeadamente no seu Capítulo IV, que trata do regime sancionatório e da responsabilidade disciplinar.

Em caso de incumprimento do RGPC, incluindo a obrigação de registo e submissão de documentação na plataforma, as entidades podem enfrentar as seguintes consequências:

  • Contraordenação: A não implementação de um sistema de controlo interno, como o exigido pelo RGPC, é considerada uma contraordenação. A coima para esta contraordenação varia entre € 2.000,00 e € 44.891,81 para pessoas coletivas e entidades equiparadas, e até € 3.740,98 para pessoas singulares.
  • Responsabilidade dos Dirigentes: Os titulares do órgão de administração ou dirigentes das pessoas coletivas ou entidades equiparadas são responsáveis pelo pagamento das coimas aplicadas por contraordenações. Esta responsabilidade estende-se aos responsáveis pelo cumprimento normativo e aos responsáveis pela direção ou fiscalização das áreas onde a contraordenação foi praticada.
  • Sanções Acessórias: Para além das coimas, o RGPC prevê a possibilidade de aplicação de sanções acessórias. No caso de pessoas coletivas de direito privado, a sanção acessória pode incluir a publicidade da condenação, a expensas do infrator, num jornal ou na página oficial do MENAC.
  • Responsabilidade Disciplinar: No caso de entidades públicas, a violação dos deveres previstos no RGPC pode constituir uma infração disciplinar para os dirigentes. As sanções disciplinares aplicáveis estão previstas no Código do Trabalho ou na Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas.

É importante destacar que a obrigação de registo na Plataforma RGPC visa garantir a fiscalização da implementação do RGPC pelo MENAC. Através da plataforma, o MENAC pode acompanhar o cumprimento das normas, solicitar esclarecimentos e, se necessário, acionar os mecanismos sancionatórios.

A falta de registo pode ser interpretada como uma tentativa de obstruir a fiscalização e, consequentemente, agravar a eventual sanção.

O que é o PCN e o que deve incluir

O Programa de Cumprimento Normativo (PCN) é um conjunto de medidas e instrumentos que as entidades abrangidas pelo Regime Geral de Prevenção da Corrupção (RGPC) devem adotar para prevenir, detetar e sancionar atos de corrupção e infrações conexas. Trata-se de um elemento essencial no cumprimento do RGPC, que visa promover uma cultura de ética e integridade nas organizações.

O PCN deve incluir, pelo menos, os seguintes elementos:

  • Plano de Prevenção de Riscos de Corrupção e Infrações Conexas (PPR): Este plano identifica, analisa e classifica os riscos de corrupção a que a entidade está exposta e define medidas preventivas e corretivas para mitigar esses riscos. O PPR abrange toda a organização, incluindo áreas de administração, direção, operacionais e de suporte.
  • Código de Conduta: O Código de Conduta define os princípios, valores e regras de atuação ética que os dirigentes e trabalhadores devem seguir no exercício das suas funções. Deve ser elaborado considerando as normas penais referentes à corrupção, os riscos da entidade e as sanções disciplinares aplicáveis.
  • Programa de Formação: As entidades devem realizar programas de formação para os seus dirigentes e trabalhadores, com o objetivo de os sensibilizar para as políticas e procedimentos de prevenção da corrupção e garantir a sua compreensão e aplicação.
  • Canal de Denúncias: As entidades devem dispor de canais de denúncia interna para que os seus colaboradores possam reportar, de forma anónima, confidencial e segura, suspeitas de atos de corrupção ou outras irregularidades. Os canais de denúncia devem cumprir os requisitos da Lei n.º 93/2021, que transpõe a Diretiva (UE) 2019/1937, relativa à proteção de denunciantes.
  • Procedimentos de Mecanismos de Controlo:  Para além destes elementos, o PCN deve também incluir um sistema de controlo interno que assegure a sua efetividade. Este sistema deve garantir a transparência e imparcialidade dos procedimentos e decisões, bem como a monitorização e avaliação regular do programa.
  • Publicidade dos documentos e elaboração e envio de relatórios: A publicidade dos documentos e a elaboração e envio de relatórios são aspetos cruciais do Programa de Cumprimento Normativo (PCN) no âmbito do Regime Geral de Prevenção da Corrupção (RGPC). Estas obrigações visam garantir a transparência e a responsabilização das entidades, demonstrando o seu compromisso com a ética e a integridade.
  • Designação do RCN:  A designação de um Responsável pelo Cumprimento Normativo (RCN) é fundamental para garantir a implementação e o bom funcionamento do PCN. O RCN deve ter autonomia e independência para coordenar os trabalhos, monitorizar a execução das medidas, promover a formação e garantir a atualização regular do programa.

Canal de Denúncias Interno

Um canal de denúncias é um mecanismo formal que permite a qualquer pessoa, geralmente chamada de denunciante ou whistleblower, reportar suspeitas de irregularidades, ilegalidades ou atos antiéticos, como a corrupção, dentro de uma organização. O Regime Geral de Prevenção da Corrupção (RGPC) português e a Lei n.º 93/2021, que transpõe a Diretiva (UE) 2019/1937, estabelecem a obrigatoriedade e as principais características dos canais de denúncia em Portugal.

As principais características de um canal de denúncias eficaz são:

Acessibilidade:

  • Disponibilidade para Todos: O canal deve estar acessível a todos os colaboradores da organização, incluindo funcionários, dirigentes, estagiários, voluntários e fornecedores.
  • Meios de Acesso Diversificados: O canal deve permitir a submissão de denúncias por diferentes meios, como plataformas online, linhas telefónicas dedicadas, email ou, a pedido do denunciante, reuniões presenciais.

Confidencialidade e Proteção:

  • Garantia de Anonimato: O canal deve possibilitar a submissão de denúncias anónimas, protegendo a identidade do denunciante.
  • Confidencialidade das Informações: A identidade do denunciante e quaisquer informações que permitam a sua identificação devem ser tratadas com a máxima confidencialidade, sendo o acesso restrito apenas às pessoas responsáveis pelo tratamento das denúncias.
  • Proteção Contra Retaliações: O RGPC e a Lei n.º 93/2021 proíbem explicitamente qualquer tipo de retaliação contra o denunciante, seja ela profissional, social ou legal.

Independência e Imparcialidade:

  • Gestão Independente: A gestão do canal de denúncias deve ser independente, seja por um departamento interno designado ou por uma entidade externa especializada.
  • Investigação Imparcial: A investigação das denúncias deve ser conduzida de forma imparcial e objetiva, assegurando a justiça e a devida diligência.
  • Prevenção de Conflitos de Interesse: As pessoas responsáveis pelo tratamento das denúncias devem ser isentas de conflitos de interesse, garantindo a imparcialidade do processo.

Eficácia e Transparência:

  • Tratamento Atempado das Denúncias: O canal deve ter mecanismos para garantir o tratamento célere e eficiente das denúncias, cumprindo prazos definidos para a sua análise e resposta.
  • Feedback ao Denunciante: O denunciante deve ser informado sobre o recebimento e o andamento da sua denúncia, sendo-lhe comunicado o resultado da investigação e as medidas tomadas.
  • Monitorização e Avaliação: O funcionamento do canal de denúncias deve ser monitorizado e avaliado periodicamente para garantir a sua eficácia e identificar áreas de melhoria.

A implementação de um canal de denúncias robusto e confiável é fundamental para criar um ambiente de trabalho ético e transparente, permitindo a deteção e a correção de irregularidades de forma célere e eficaz. A S2L e o software de gestão inWork pode ajudar na implementação de um canal de denúncias disponível online, que garante o anonimato, a confidencialidade e o cumprimento do dever de comunicação, mesmo para um denunciante anónimo. A proteção dos denunciantes é crucial para encorajar a comunicação de suspeitas e prevenir a impunidade em casos de corrupção e outras infrações.

Como fazer para fazer o registo o MENAC

O registo na Plataforma RGPC do MENAC é obrigatório para todas as entidades públicas e privadas abrangidas pelo Regime Geral de Prevenção da Corrupção (RGPC), e deve ser feito até 14 de fevereiro de 2025. O processo varia consoante a entidade já disponha ou não de um pré-registo na plataforma.

Entidades Públicas com Pré-Registo:

  1. Verificação de Elegibilidade: A sua entidade deve estar registada na base de dados da Direção Geral da Administração e do Emprego Público (DGAEP) e ter um endereço de email válido registado.
  2. Receção da Notificação: O MENAC envia uma notificação para o email registado, informando sobre o pré-registo e o procedimento para ativar o acesso à plataforma.
  3. Aceder à Plataforma: Aceda ao link https://entidade.mec-anticorrupcao.pt.
  4. Inserir o Código SIOE: Introduza o Código SIOE da sua entidade, atribuído pela DGAEP, e o código Captcha.
  5. Recuperar a Palavra-Passe: Receberá um email com instruções para definir a sua palavra-passe.
  6. Definir a Palavra-Passe: Siga as instruções no email, inserindo o token recebido, o Código SIOE, a nova palavra-passe e o código Captcha.
  7. Autenticar-se na Plataforma: Utilize o Código SIOE e a palavra-passe definida para aceder à plataforma.

Entidades Públicas sem Pré-Registo:

  1. Solicitar Criação de Credenciais: Envie um email para registo@mec-anticorrupcao.pt com os seguintes dados:
  • Designação completa da entidade
  • Número de identificação de pessoa coletiva da entidade (se aplicável) e Código SIOE (se aplicável)
  • Endereço de correio eletrónico oficial da entidade
  1. Comprovar a Identidade: Anexe ao email a documentação comprovativa da identidade do requerente e das suas funções na entidade, bem como uma cópia do cartão de pessoa coletiva (se aplicável).
  2. Receber as Credenciais: O MENAC irá analisar o pedido e, se aprovado, enviar um email com um link para a Plataforma RGPC e um código de acesso.
  3. Aceder à Plataforma e Definir a Palavra-Passe: Aceda ao link fornecido e siga as instruções para definir uma nova palavra-passe.

Entidades Privadas com Pré-Registo:

O processo para entidades privadas com pré-registo é semelhante ao das entidades públicas, com a diferença de que o utilizador corresponde ao NIF da entidade. As entidades privadas elegíveis para pré-registo estão registadas na base de dados do Instituto da Segurança Social e têm um endereço de email válido registado.

Entidades Privadas sem Pré-Registo:

  1. Solicitar Criação de Credenciais: Envie um email para registo@mec-anticorrupcao.pt com os dados da entidade.
  2. Receber as Credenciais: O MENAC enviará um email com um link para a Plataforma RGPC e um código de acesso.
  3. Aceder à Plataforma e Definir a Palavra-Passe: Aceda ao link fornecido e siga as instruções para definir uma nova palavra-passe.

Após o registo, as entidades devem submeter a informação e documentação relativa ao seu Programa de Cumprimento Normativo (PCN), incluindo o Plano de Prevenção de Riscos (PPR), o Código de Conduta e outros documentos relevantes, conforme os prazos definidos pelo MENAC1. O não cumprimento destas obrigações pode resultar em sanções, conforme previsto no RGPC e descrito anteriormente

As entidades que já submeteram documentos por outros meios devem carregar as versões mais recentes na plataforma.

Deixe um comentário

Close
Close